Organizada pelas Frotas de uma companhia de transporte aéreo nacional, e contando com o ponderado beneplácito do respectivo departamento de Treino e Instrução, teve lugar no passado mês de Dezembro uma romagem ao Santuário da Cova da Iria, com passagem baixa pela Loca do Anjo.
Ao piedoso evento disseram presente todos os pilotos da empresa, incluindo uma meia-dúzia que se encontrava em situação de baixa por motivo de doença, os reformados e, até, os que haviam já falecido, tendo, neste último caso, apenas as almas participado no cortejo.
O vade-mécum da peregrinação revestia-se de algum melindre, para dizer o mínimo, tratava-se, facto inédito, do despedimento sumário de Nossa Senhora do Loreto do cargo de padroeira oficial das frotas e a indigitação, para o pelouro devoluto, de Nossa Senhora do Rosário de Fátima.
No decorrer da cerimónia de encerramento da romaria, imediatamente antes do período dos comes e bebes, foi, por vários oradores, severamente criticado o desempenho da anterior Santa Padroeira quando de um badalado berbicacho na descida para os Açores. Com efeito, no expressivo dizer do primeiro orador, um Chefe com cara de pau-mandado, “é um dado adquirido que a Nossa Senhora do Loreto não esteve, na embaraçosa ocasião, à altura dos acontecimentos. Quando decidimos os cortes na carga horária da instrução fizemo-lo no pressuposto de que a Santa Padroeira cumpriria a sua parte do acordo. Tal não se veio, no entanto, a verificar”. E afirmou, em seguida, pondo um ponto final na sua intervenção: “Deste modo, e um pouco a contra gosto, vimo-nos forçados a rever os termos do protocolo em vigor. Já tínhamos ficado de pé atrás com aquela aventura do desvio pelos tropas americanos mais a cena do idiota que caiu vinte e quatro mil pés em perda por cima dos pretos. Agora foi a gota de água. Procederemos, de imediato, à publicação de uma T.R. sendo, em data posterior, o texto respectivo incluído no AOPM”.
O perorador que se seguiu, um sujeito sardento, de cabeladura alaranjada e rala, falinhas mansas, postura teutónica e fama de fdp, identificado como sendo O chefe dos chefes, fez saber à reverenciosa assembleia que: “Os nossos pilotos, particularmente os senhores comandantes (1) integram uma classe profissional profundamente devota. A atestá-lo, se necessário tal se viesse a verificar, está o facto de, quando o copiloto acaba de aterrar, o senhor comandante sempre diz: – Valha-o Deus, homem”.
“Queria também aproveitar esta oportunidade para desmentir categoricamente algumas notícias recentemente vindas a público”, continuou, após breve, mas carregada de significado, pausa. “Em momento algum foi por nós requerida ao INAC a certificação do Escapulário de Nossa Senhora do Carmo e, muito menos, o adquirimos junto dos www.convento-portugal.com. Aliás, no respeitante a esses senhores, gostaria de deixar bem claro que os únicos artigos que alguma vez recebemos deles, um crucifixo de prata com a inscrição made in Fenghuangshan, RoC e uma caixinha para guardar hóstias em madeira exótica com incrustações de plástico amarelo, se encontravam em deplorável estado aquando da entrega, pelo que tiveram de ser devolvidas e o respectivo pagamento de imediato cancelado”.
A terminar, a repelente criatura acrescentou, dedo espetado e pelada no alto da careca, que: “Chegou ao nosso conhecimento o facto de alguns pilotos terem vindo a usar, a título particular, o Bentinho do Carmo para efeitos de protecção suplementar contra as diabruras do Treino e Instrução. Embora seja, em princípio, de louvar, tal prática configura proselitismo e falta de respeito devido a Nossa Senhora de Fátima, mãe dos aflitos, cujos olhos misericordiosos se volvem para este mundo tão necessitado de paz, saúde e justiça. Nossa Senhora do Rosário é a rainha de todos os anjos e santos, a santinha clemente, piedosa, esplendor do céu, doce e compadecida, que tão largos benefícios tem trazido a este nosso Portugal, nomeadamente à zona de Toucinhos e Fungalvaz, região mergulhada em crise desde que o Sr. Júlio marceneiro encerrou definitivamente a sua fábrica de mesas de cozinha”.
(1) Ele diz sempre senhores comandantes.